As Instituições de Ensino Superior (IES) brasileiras são regidas pelo preceito institucional da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. A relação direta entre universidade e sociedade cabe à extensão, por meio da divulgação de saberes científicos ou serviços que auxiliam na formação de novos profissionais.
Na Universidade do Estado do Pará (Uepa), os ensinamentos dos professores da instituição – homenageados em 15 de Outubro, ao lado de todos os demais mestres do conhecimento e formadores de cidadãos – vão além da sala de aula, com diversas ações extensivas, como o Projeto “Promovendo Saúde e Higiene Pessoal na Mulher: Uma Abordagem de Extensão Comunitária com Adolescentes”, executado no campus IV da Uepa, a Escola de Enfermagem Magalhães Barata (EEMB), vinculada ao Centro de Ciências Biológicas e da Saúde (CCBS), em Belém.
Cuidado feminino – Com orientação da professora Eliseth Costa Oliveira de Matos, e realizado pelas acadêmicas do 3º ano do curso de Enfermagem Aghata Costa, Hannah Freire, Jennify Silva e Joyce Vasconcelos, o projeto leva informações essenciais a meninas no início da adolescência. Composto por quatro ações na Escola de Ensino Fundamental Olga Benário, no bairro do Aurá, em Ananindeua (Região Metropolitana de Belém), o objetivo é a promoção da saúde e higiene pessoal da mulher.
Além do apoio do curso de Enfermagem, que em 2024 comemora 80 anos, o projeto vinculado à Pró-Reitoria de Extensão (Proex) conta ainda com a colaboração do Grupo de Pesquisa Determinantes dos Processos Infecciosos e Parasitários em Ambientes Amazônicos (DPIPAA), da Escola de Enfermagem e do Centro de Referência de Assistência Social (Cras Aurá).
Cada ação, que promove o autocuidado feminino, já atendeu 25 meninas, na faixa etária de 12 a 17 anos, envolvendo informações sobre cuidados com pele, cabelo, partes íntimas, higiene bucal, nutrição e lavagem das mãos.
Para a professora Eliseth de Matos, os projetos e atividades de extensão são fundamentais no contexto educacional e social, pois cumprem a função de unir o ensino e a pesquisa das instituições de ensino superior com a comunidade externa, retribuindo e sendo uma forma de colocar em prática o conhecimento adquirido em sala de aula, contribuindo para a formação integral dos universitários e o desenvolvimento social da comunidade envolvida”, informa.
Conectando o ensino à participação ativa do aluno, o papel do professor vai muito além de apenas transmitir conhecimentos: “Nós somos um facilitador do aprendizado, um orientador e um mediador que ajuda os alunos a desenvolverem habilidades, senso crítico e autonomia. Isso significa criar um ambiente de aprendizagem, onde os estudantes possam explorar, questionar e construir conhecimento de forma ativa e significativa. Para mim, ser professora é ter a oportunidade de impactar vidas de maneira profunda, moldando a visão de mundo dos estudantes e contribuindo para o seu crescimento pessoal e profissional. É um papel de grande responsabilidade e, ao mesmo tempo, de uma realização única, pois envolve não só ensinar, mas aprender continuamente, adaptando-se às mudanças e às necessidades dos alunos e da sociedade”, ressalta Eliseth de Matos.
Saúde e meio ambiente – Outra ação que surgiu como atividade acadêmica, proposta pela docente do Curso de Saúde Coletiva do CCBS, Cláudia Miranda, foi o Projeto “O Trabalho dos Profissionais da Limpeza Urbana no Bairro do Marco, em Belém”, em que os alunos do 4º período de Saúde Coletiva debateram sobre saúde única e refletiram sobre a atuação e importância dos trabalhadores da limpeza da cidade. Com o objetivo de compreender o processo de trabalho desses profissionais, e sua relação com a saúde e o meio ambiente, a disciplina “Atividade Integradora Saúde, Ambiente e Sociedade”, ministrada pela professora Cláudia Miranda, desvendou o preconceito e a invisibilidade social desses trabalhadores como um reflexo da rejeição associada ao lixo.
As atividades ocorreram em duas etapas. Primeiramente, os alunos observaram o cotidiano dos trabalhadores, conversaram com eles sobre suas condições laborais e a forma como são tratados durante a prestação de serviços. De acordo com a professora Cláudia Miranda, na perspectiva da saúde e meio ambiente, independentemente da discriminação sentida no dia a dia, os garis compreendem seu papel na prevenção de doenças e manutenção da saúde nos locais de atuação, contribuindo para o bem-estar social, a sustentabilidade e qualidade de vida da população.
Na segunda fase do projeto, estudantes e professora promoveram uma ação educativa em saúde no bairro, para conscientizar e sensibilizar a comunidade sobre a relevância dos trabalhadores de limpeza urbana. Moradores foram orientados sobre o tratamento adequado a esses profissionais e sobre descarte correto de resíduos, em uma iniciativa voltada para a construção de uma cidade mais sustentável.
Como parte da ação, os coletores receberam garrafas de água com mensagens de agradecimento e valorização pelo trabalho desempenhado em prol da saúde pública. Segundo Cláudia Miranda, o bom funcionamento de uma cidade depende diretamente desses trabalhadores, que devem ser reconhecidos e respeitados. Ela destacou ainda a importância das atividades de extensão na formação dos alunos, promovendo cidadania e impacto social positivo.
Mulheres na Ciência – No Centro de Ciências e Planetário do Pará (CCPPA), vinculado à Uepa por meio da Pró-Reitoria de Extensão, o Projeto “Astrociência: Meninas e Mulheres nas Ciências no Pará” visa incentivar a participação feminina em atividades ligadas à ciência e encorajar o acesso de meninas em áreas que, ainda na atualidade, têm a predominância masculina. É voltado a estudantes do Ensino Fundamental e Médio, das redes pública e privada de ensino.
A iniciativa está em sua segunda edição e oferta atividades, quinzenalmente, de forma gratuita. O projeto é conduzido pelo coletivo feminino Tainá-Kan, formado por servidoras e estagiárias de diferentes áreas do conhecimento do CCPPA, que busca a popularização e a valorização das mulheres e meninas no ambiente científico. Quinze estudantes de escolas públicas e privadas participam das ações, que, neste ano, iniciaram em abril e prosseguem até dezembro.
De acordo com a integrante do “Astrociência” e professora da Uepa, Bianca Venturieri, já foram desenvolvidas oficinas sobre várias temáticas, com ênfase na ampliação do conhecimento científico, de forma prática e contextualizada, como: Conhecendo o mundo microscópico; Invenção das calculadoras; Construção e lançamento de foguetes; Meio ambiente e compostagem; Construção de terrários e Química dos cosméticos. Segundo a docente, é uma satisfação fazer parte do projeto, pois “durante esses dois anos, foi possível perceber, pelo relato das meninas, como essas atividades contribuíram para o desenvolvimento pessoal de todas as participantes”.
A professora da Uepa Jeane Costa, que coordena o “Astrociência”, diz estar honrada pelo trabalho que, muitas vezes, a faz revisitar memórias da própria caminhada profissional. “Eu fiquei muito feliz quando as colegas participantes do coletivo Tainá-Kan me convidaram para escrever esse projeto. Para mim, foi uma honra poder submetê-lo como um projeto de extensão. Primeiro porque não dá para desvinculá-lo da minha vivência, e do quanto me faz lembrar da minha vida estudantil, das barreiras que enfrentei, principalmente como mulher. Mas, mesmo com todas as dificuldades, eu cheguei onde estou”, afirma a docente, que é licenciada em Matemática, possui mestrado e doutorado em Educação Matemática e atua no Centro de Ciências Sociais e Educação (CCSE) da Uepa.
Jeane Costa descreve a experiência de ser coordenadora do projeto como “transformadora”, afirmando que o estímulo para que as meninas se interessem pela área científica deve iniciar na educação básica, para que, desde cedo, “quebrem o estereótipo de que determinadas áreas estão relacionadas somente a um gênero”.
Ela acrescenta que “é necessário mostrar que todas as áreas que envolvem as ciências são ‘terra de todos’, para que as meninas se sintam estimuladas e, principalmente, empoderadas a fazer o que quiserem. Nossas ações englobam não somente a Matemática, mas também Astronomia, Biologia, Química e Física, para que as participantes conheçam as diferentes áreas e saibam aonde querem chegar. É gratificante estar neste projeto, e fico muito feliz em poder contribuir com o futuro dessas meninas”.
Fazer a diferença – O projeto de extensão vem fazendo a diferença na vida das integrantes, garante a estudante do Ensino Fundamental Aléxia Pavão, que participa da iniciativa e pretende cursar Medicina ou Química na graduação. “Além de ser extremamente acolhedor para todas as pessoas, sem dúvidas o projeto contribui para diversas garotas, principalmente para aquelas que pensam em seguir alguma ciência, pois hoje em dia é difícil encontrar mulheres que tenham um lugar de fala nessa área”, diz a estudante.
Segundo Aléxia Pavão, o “Astrociência” também contribui para sua vida escolar e social. “O projeto tem me ajudado muito com a questão da socialização, principalmente com as monitorias – já que sou um pouco tímida em público -, como também me ajuda com matérias da escola, já que no projeto tem Matemática, Física, Química, Astronomia e Biologia. É bem abrangente, adquiri muitos conhecimentos, dos quais eu não conhecia ou pensava conhecer”, relata. No “Astrociência” ela descobriu a paixão pela Química, disciplina que ainda não havia estudado na escola. “Com as oficinas, essa área se tornou ainda mais interessante para mim”, garante Aléxia.
A estudante do Ensino Médio Hannah Gouvêa conheceu o projeto por meio de seu pai, que a apoia no campo acadêmico. Segundo Hannah, participar da iniciativa a auxilia a utilizar de maneira prática o que aprende na escola, além de incentivá-la na aprendizagem. “Eu achei incrível a proposta, e repetiria a experiência se tivesse a chance”, afirma. De acordo com Bianca Venturieri, a expectativa é que o “Astrociência” tenha continuidade no próximo ano, alcançando um público maior de meninas.
Extensão para a COP 30 – Natural da Bahia, o professor Matheus Souza recentemente integrou o quadro docente da Uepa, no Curso de Relações Internacionais, vinculado ao Centro de Ciências Naturais e Tecnologia (CCNT). Com mais de dez anos de experiência na área, ele destaca que “o Pará, pode-se dizer, é a ‘nova fronteira’ das Relações Internacionais no Brasil”.
Com essa perspectiva, Matheus Souza coordena o curso de extensão “Introdução a Cerimonial e Protocolo de Eventos Internacionais”, destinado a estudantes da universidade e ao público em geral. Segundo ele, profissionais de Relações Internacionais frequentemente organizam e executam eventos internacionais, mas o conhecimento sobre Cerimonial e Protocolo não costuma ser abordado nas grades curriculares. “Percebi que poderia contribuir para a formação dos alunos compartilhando essa expertise. Tenho alguma vivência na área e acredito que será relevante transmitir as lições aprendidas – especialmente os ‘micos’ que cometi em diferentes eventos internacionais”, conta o professor.
Difusão científica – A extensão universitária desempenha um papel essencial na formação acadêmica, complementando o ensino e a pesquisa. As universidades devem disseminar conhecimento nas comunidades, promovendo a difusão científica, o que torna vital a conexão entre instituições acadêmicas e a sociedade, evitando o isolamento do saber e suas consequências negativas.
“As atividades de extensão, portanto, ajudam a tornar a universidade uma instituição familiar à sociedade, em suas diversas camadas – seja para auxiliar na resolução de problemas, qualificá-la ou mesmo aprender com ela, algo comum nesse processo. Com a extensão, não é apenas a comunidade que é beneficiada pela universidade; esta também se enriquece com o saber popular”, observa Matheus Souza.
O docente ressalta ainda que as atividades de extensão são fundamentais para os alunos, que têm a oportunidade de se conectar com setores da sociedade que talvez não conhecessem. Segundo ele, “por meio desse contato, uma miríade de habilidades pode ser adquirida. Existem conhecimentos que não se obtêm apenas por meio da leitura ou da participação em aulas tradicionais”. Na extensão, acrescenta, os estudantes podem “aprender fazendo”, desenvolvendo competências em atividades além da sala de aula.
Outro projeto no curso de Relações Internacionais enfatiza a assistência humanitária. A Sentrion Empresa Júnior, explica a professora Mayane Bento, “oferece serviços como consultorias em internacionalização de empresas e projetos de cooperação descentralizada, aplicando ferramentas de análise de mercado, planejamento estratégico e gestão de projetos. Atualmente, estamos expandindo as atividades para incluir a responsabilidade social, por meio da assessoria humanitária”.
Mayane Bento acredita que essa atividade permite que “os estudantes desenvolvam habilidades como liderança, trabalho em equipe e pensamento crítico, pois a vivência empresarial proporciona uma compreensão realista dos desafios do mercado”.
O desafio na carreira docente reside em equilibrar o tempo entre as aulas e as atividades de extensão, que complementam o aprendizado teórico de forma prática. “Além de assegurar que a universidade atue diretamente na sociedade, que é a essência da educação. Nesse contexto, é importante contar com a colaboração dos demais professores, especialmente do professor Heriberto Pena, que coordena o projeto, e dos novos docentes que se juntam a nós”, ressalta.
A professora Mayane Bento declara ainda que “a possibilidade de orientar atividades, como a Sentrion EJ, e observar o crescimento dos estudantes me motiva diariamente. Isso reforça meu compromisso com uma qualidade acadêmica que considera, mas não se limita, ao mercado de trabalho”.
Texto: Diane Maués, Monique Hadad e Marília Jardim – Ascom/Uepa
Fonte: Agência Pará/Foto: Marcelo Lelis/Ag Pará