sexta-feira, dezembro 12, 2025
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Artigo – Santo Ezequiel Moreno e o pós-COP30: a Amazônia marajoara que o Brasil precisa enxergar

O debate pós-COP30 escancarou uma contradição profunda que atravessa o Brasil e o mundo: enquanto discursos internacionais exaltam direitos humanos, direitos da natureza e transição ecológica, a prática política continua submetida a lobbies econômicos que insistem no velho modelo de destruição ambiental.

Mas, se Brasília, Belém, Nova York ou Dubai hesitam, a Amazônia profunda — aquela que raramente tem voz nos centros de decisão — já aponta o caminho que o país deveria seguir.

A comunidade Santo Ezequiel Moreno, no município de Portel, na Amazônia marajoara, é prova disso: a floresta oferece alternativas reais. E mais — essas alternativas não nascem em gabinetes ou cúpulas internacionais, mas do próprio território, da organização comunitária e do compromisso direto com a vida.

O fracasso político exposto pela COP30

A COP30 trouxe uma participação social inédita, com povos tradicionais, movimentos ambientais e organizações amazônicas colocando suas pautas no centro do debate. Mas, passada a euforia dos palcos, veio a frustração dos compromissos não assumidos:

  • nada de eliminação total dos combustíveis fósseis;
  • avanços tímidos na demarcação de territórios;
  • e uma defesa vaga dos direitos da natureza, ainda distante de se tornar política pública.

A contradição é conhecida: o discurso é verde, mas a política segue cinza — capturada por grupos econômicos que lucram com a destruição da Amazônia.

Enquanto isso, Santo Ezequiel Moreno faz o que os governos não fazem

No Marajó, longe dos salões da diplomacia global, os moradores de Santo Ezequiel Moreno constroem um modelo de desenvolvimento que deveria inspirar o país.

A comunidade pratica manejo sustentável do açaí nativo, produz óleos essenciais de forma responsável, organiza turismo comunitário e movimenta uma microeconomia florestal que gera renda, dignidade e permanência no território.

Ou seja: aquilo que governos prometem e corporações simulam, a comunidade realiza.

Essa força local deixa claro algo que a política nacional ainda não compreendeu:
direitos humanos e direitos da natureza não são conceitos abstratos — são práticas concretas que dependem de autonomia comunitária e proteção territorial.

A Amazônia marajoara pensa à frente do Estado brasileiro

Quando startups de impacto, como a ForestiFi, conectam cooperativas amazônicas a mercados sustentáveis por meio de blockchain, não se trata apenas de inovação tecnológica — é soberania econômica da floresta construída no presente.

Quando o turismo comunitário protege a cultura ribeirinha e a biodiversidade simultaneamente, não é simples experiência turística — é política ambiental efetiva.

Enquanto políticas nacionais ainda tratam a Amazônia como periferia, Portel e sua comunidade Santo Ezequiel Moreno já operam a economia regenerativa que o país apenas diz almejar.

O que falta não é solução — é decisão política

A comunidade mostra que a Amazônia não precisa ser destruída para gerar riqueza. O que falta ao Brasil é coragem de admitir que:

  • é preciso enfrentar o poder do desmatamento;
  • é preciso financiar de verdade a bioeconomia de base comunitária;
  • é preciso reconhecer territorialmente povos ribeirinhos e tradicionais;
  • é preciso levar ciência, tecnologia e infraestrutura para onde a floresta vive — e não apenas para onde o mercado exige.

A Amazônia marajoara já entendeu isso. Falta o Estado brasileiro entender.

A lição política de Santo Ezequiel Moreno

O exemplo da comunidade é um recado direto aos formuladores de políticas públicas:

não existe transição ecológica sem gente;

não existe justiça ambiental sem território;

não existe novo desenvolvimento sem romper privilégios antigos.

Se o Brasil quiser realmente liderar a agenda ambiental global, não basta discursar na COP.
É preciso olhar para Santo Ezequiel Moreno, para Portel, para o Marajó — para a Amazônia que funciona, que cria soluções, que vive da floresta sem destruí-la.

A política nacional precisa parar de falar sobre a Amazônia e começar a falar com a Amazônia real.

Porque o futuro que o mundo discute nas cúpulas internacionais já começou nas comunidades ribeirinhas do Marajó.

E cabe ao Estado brasileiro decidir se vai liderar esse futuro — ou continuar sendo arrastado por ele.

Por Idinor Ferreira — Secretário de Cultura e Turismo de Portel

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