terça-feira, dezembro 30, 2025
Desde 1876

João Spenthof: um missionário do cooperativismo de crédito por vocação e paixão

Com 34 anos de Sistema Sicredi, o presidente da Central Sicredi Centro Norte está há 30 no cargo, que desempenha com o mesmo amor, convicção e valores lá do começo, que o guiaram na expansão desse modelo de negócios em MT e nos estados do Norte do Brasil

O cooperativismo de crédito é considerado uma das forças mais transformadoras da sociedade brasileira, capaz de unir desenvolvimento econômico e social. Em Mato Grosso e nos estados do Norte do país, o Sicredi tem desempenhado um papel fundamental nesse processo, promovendo oportunidades, fortalecendo comunidades e impulsionando o empreendedorismo nas comunidades onde atua, que geram impactos econômicos e sociais.

Tudo o que foi conquistado até agora é mérito de verdadeiros missionários dessa filosofia de vida, e cujo caminho continua sendo trilhado para que mais adeptos se juntem à essa legião. À frente desse movimento na região está o João Carlos Spenthof, presidente da Central Sicredi Centro Norte. Aos 61 anos, dedicou mais de metade de sua vida ao Sicredi, sendo 30 deles na presidência da Central – completos em 2025. Justamente por isso é reconhecido como uma das principais lideranças do cooperativismo do país.

Em sua jornada cooperativista testemunhou o avanço do cooperativismo na região e participou ativamente do processo de estruturação das cooperativas, sua expansão e a profissionalização da gestão no sistema cooperativista. Nesta entrevista especial, ele compartilha os bastidores, os desafios, as conquistas e as perspectivas para o cooperativismo.

O senhor está há 34 anos no cooperativismo de crédito, no Sicredi, sendo 30 deles como presidente da Central Sicredi Centro Norte. Conte-nos como o cooperativismo entrou na sua vida?

Desde menino, quando ainda morava no Sul do país, já conhecia cooperativas agropecuárias. Quando chegamos a Mato Grosso, na cidade de Água Boa, em 1976, a região contava com apenas 50 famílias, que formavam uma Agrovila, criada por obra da Coopercana – uma cooperativa agropecuária que havia instalado uma estrutura de armazenagem e comercialização de grãos em toda a região. Ela exercia um papel muito importante na comunidade, uma verdadeira organização social.

Por volta de 1980 meu primeiro emprego foi justamente na Coopercana. Trabalhei por dois anos, em diversas funções. Meu pai foi conselheiro de administração da Cooperativa, o que atiçou ainda mais a minha curiosidade, principalmente sobre as tais “reuniões do Conselho”.

Depois da Coopercana fui trabalhar, como concursado, no Banco do Estado de Mato Grosso. Mas, a cooperativa não saía da minha vida, e agora ela era cliente do Banco. Fiz carreira e logo me tornei gerente, aos 24 anos. Estava na gerência do banco em Água Boa e surgia a primeira Cooperativa de Crédito do Centro-Oeste do Brasil, justamente na minha cidade. Era uma coisa que pouca gente acreditava que pudesse ser uma concorrente do banco, afinal era um “grande” banco estadual. Contudo, em 1999, o banco foi liquidado pelo Banco Central.

Comente um pouco sobre sua trajetória no Sicredi. Como tudo começou? Como chegou à presidência da Central?

Entrei no Sicredi em fevereiro de 1991, aos 27 anos, sendo eleito presidente da Credilest (Cooperativa de Crédito Rural do Leste de Mato Grosso Ltda), que era ligada à Central COCECRER MT, que ainda não estava ligada ao Sicredi. Na época eu estava no Banco Estadual em Alto Araguaia-MT e fui convidado por diversos fundadores e conselheiros da Cooperativa para disputar a presidência. A cooperativa já tinha dois anos, com apenas cinco funcionários, e o presidente havia renunciado. Essas lideranças me convidaram para assumir essa missão, tendo em vista que eu poderia desempenhar dois papéis, o de presidente e de gerente ao mesmo tempo, e levar a Cooperativa ao rumo do crescimento.

Fizemos esse trabalho de resgate. Geramos credibilidade e reposicionamos a cooperativa no rumo do crescimento. Ali descobri que minha carreira no cooperativismo poderia estar relacionada à de um missionário (mais a frente falo mais disso), quase como um padre que precisa pregar inúmeras vezes até converter os fiéis. Menos de dois anos depois, a Credilest começou a se destacar.

Em junho de 1995, houve a renúncia do vice-presidente da Central, três meses depois de ser eleito. Numa reunião que eu nem estava presente, me designaram como vice. A partir daí compus a diretoria junto com o presidente Padre João e o secretário Alcino Uggeri, cumprindo a função de principal executivo no dia a dia da Central.

Foi um momento delicado, pois aos 32 anos atuava como presidente e gerente da Credilest e jamais havia pensado num sucessor. A solução foi compartilhar as funções na singular e ainda dirigir a Central. Morava em Cuiabá e Água Boa, distantes 750 km uma da outra, e passava duas noites por semana no ônibus da Xavante. Fiz isso por três meses e me mudei para Cuiabá, depois de contratarmos um gerente para Água Boa. Mesmo assim continuei exercendo a presidência na singular.

Em março de 1998 fui eleito presidente da Central. Foi quando finalmente saí da Cooperativa e assumi com dedicação integral à COCECRER-MT.

Quais os maiores obstáculos enfrentados em sua carreira para a consolidação do cooperativismo de crédito e do Sicredi em Mato Grosso?

O primeiro grande desafio foi a consolidação das cooperativas por meio de uniões e incorporações, o que resultou em nove cooperativas ligadas à Central Centro Norte, todas de grande porte. No Pará, três cooperativas criadas foram incorporadas pela Sicredi Sudoeste MT, fortalecendo a expansão e garantindo maior escala e representatividade regional. Outro obstáculo relevante ocorreu até 2013, antes da criação das diretorias executivas por profissionais de mercado. Até então, presidentes e vice-presidentes que compunham o Conselho de Administração acumulavam funções de gestão, sem que o Banco Central exigisse formação específica para gestão de instituição financeira, e isso era um obstáculo para a implantação das melhores práticas de governança.

A expansão para Rondônia e, principalmente para o Pará foi um grande desafio. O plano inicial previa 14 novas cooperativas, mas apenas três foram criadas (Redenção, Paragominas e Parauapebas). Com o tempo, devido à necessidade de escala e profissionalização, essas cooperativas se uniram a outras, e a Sicredi Grandes Rios ocupou a região de Santarém, Itaituba e Novo Progresso, consolidando a presença no estado. A implantação da segregação de funções entre presidentes e conselheiros (eleitos pelos sócios) e diretores (eleitos pelo Conselho), exigida pelo Banco Central, foi outro processo complexo. A nova estrutura, com diretores profissionais aprovados pelo regulador, afetou o trabalho dos dirigentes eleitos, exigindo deles uma adaptação cultural e a redefinição de seu papel voltado à governança, relacionamento e condução institucional das cooperativas.

A partir de 2015, houve a reorganização das áreas de atuação das centrais do Sicredi, distribuindo o país entre cinco centrais e definindo a região Norte (exceto MT e TO) como responsabilidade da Central Centro Norte. Cada cooperativa passou a planejar sua própria expansão. Esse movimento levou à ocupação de Amapá, parte do Pará, Roraima, Acre, Rondônia e Amazonas por diferentes cooperativas da Central, chegando a cerca de 350 agências. Por fim, outro desafio contínuo foi garantir expertise e estrutura técnica na Central para apoiar, orientar e supervisionar as cooperativas. A dificuldade estava tanto em atrair profissionais qualificados quanto em obter orçamento aprovado pelas cooperativas, sempre exigindo justificativas detalhadas, ano após ano.

O senhor é considerado um missionário do Sicredi e do cooperativismo de crédito. Atuou ativamente na expansão do sistema. Conte-nos como foi, as dificuldades e conquistas?

Sempre me considerei num papel de missionário na expansão do Sicredi para a região Norte, com a preocupação de levar o cooperativismo de crédito a todas as regiões. As principais dificuldades foram o desconhecimento sobre cooperativismo, sobre o Sicredi, exigindo um grande trabalho de apresentar os benefícios e mostrar que fazemos parte de um sistema maior, robusto e com essência diferente dos bancos. Hoje vejo como conquista o fato de a região Norte receber o Sicredi de braços abertos. Muitos municípios procuram a instituição ao ver os resultados em outras cidades. Mesmo em agências novas, onde as equipes ainda estão em processo de aculturação, conseguimos entregar um atendimento diferenciado. Enquanto muitos bancos têm filas longas e tarifas abusivas, o Sicredi oferece atendimento personalizado, com mais atenção e cidadania.

Ao longo de sua trajetória à frente da Central, quais os principais marcos de sua atuação? Teve que tomar muitas decisões difíceis?

As decisões mais difíceis sempre foram relacionadas às uniões entre cooperativas, especialmente ao comunicar a necessidade da Central e convencer presidentes, conselhos e associados. Também foram complexas as situações em que foi preciso trabalhar com o regimento interno de baixo do braço para exercer com eficácia o papel de supervisão delegada pelo Banco Central à Central. Nos últimos dois anos, a crise de endividamento no agronegócio, causada por eventos climáticos e recuperações judiciais, também trouxe grandes desafios. Entre os marcos da minha atuação, destaco a expansão para a região Norte, a consolidação de cooperativas fortes e relevantes e o crescimento de associados acima da média do sistema, com o maior índice de penetração na população economicamente ativa. Esse resultado veio da crença disseminada por muitos anos de que o Sicredi é para todos e faz diferença na vida das pessoas, valorizando cada município onde está presente. Isso gerou uma grande mobilização interna e um forte engajamento na causa, refletido também na lembrança de marca. Mato Grosso hoje é o estado com maior lembrança de marca do Sicredi, consequência direta do aumento da participação da população no quadro social.

Falando de legado, o que o senhor destacaria como contribuição direta de sua atuação para o Sicredi e para o cooperativismo de crédito?

Eu destacaria a conquista da autorização legal para que prefeituras movimentem recursos em cooperativas de crédito. Foi uma mobilização intensa, com muitas viagens a Brasília e reuniões com parlamentares de vários estados, até conseguirmos a aprovação unânime no Congresso. Outro projeto tão ou mais importante foi o acesso aos fundos constitucionais, iniciado no Centro-Oeste, quando conseguimos o apoio do então governador Blairo Maggi, que já era cooperado e conhecia bem a capilaridade e solidez do Sicredi, além de ter experiência com o Rabobank (um banco cooperativo holandês). Com o apoio dele, do governador de Mato Grosso do Sul e dos parlamentares, conseguimos aprovar os primeiros limites junto ao Banco do Brasil para operar o FCO, que hoje soma mais de R$ 2 bilhões em carteira. Depois veio a autorização para operar o FNO (no Norte), onde já temos quase R$ 1 bilhão. Foi um projeto difícil, mas a determinação foi maior. Hoje esse acesso aos programas governamentais é um diferencial importante.

E quais são seus planos para o futuro?

O futuro a Deus pertence, mas faço alguns planos. Pretendo ficar mais um tempo no Sicredi, talvez mais um mandato, e depois servir ao cooperativismo de Mato Grosso ou ao Sicredi Nacional de outra forma. Também penso em atuar como mentor ou coaching de dirigentes, dar cursos, palestras, escrever um livro ou fazer consultoria para cooperativas, além de aproveitar a aposentadoria com mais qualidade de vida.

Por fim, deixe uma mensagem para os associados, colaboradores e a sociedade.

Minha mensagem para associados, colaboradores e sociedade é: não percam a fé, não desistam e sejam determinados naquilo que acreditam. Lutem por suas ideias e contribuam para fazer um Sicredi cada vez maior e melhor, sendo presentes e levando o propósito adiante, inspirando outras pessoas. Nosso papel como líderes é repetir constantemente nossos valores, nosso propósito e o impacto que o Sicredi gera. Para a sociedade em geral, digo ‘acreditem no cooperativismo em todas as áreas. Não só no crédito’. Podemos construir modelos cooperativos no comércio, na agricultura e em vários setores, formando uma sociedade mais próspera e com mais qualidade de vida por meio da união e da cooperação.

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