domingo, agosto 17, 2025
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Bate-papo na Feira Pan-Amazônica celebra a vida e a obra do Mestre Damasceno, ícone da cultura popular marajoara

A programação cultural da noite contou ainda com shows de três referências do carimbó paraense: Mestre Robledo, Mestre Eliezer e o grupo Nativos Marajoara

Por Vinícius Leal (IDEFLOR-BIO)

A 28ª Feira Pan-Amazônica do Livro e das Multivozes abriu sua programação cultural na noite desta sexta-feira (16) com uma homenagem especial ao Mestre Damasceno, um dos grandes nomes da cultura popular do Pará e do Brasil. O bate-papo reuniu o pesquisador e produtor cultural Guto Nunes e o professor Agenor Sarraf, que compartilharam reflexões sobre a trajetória do compositor, cantor e repentista marajoara, reverenciado como um verdadeiro guardião da oralidade amazônica.

Nascido em 22 de julho de 1954, na Comunidade Quilombola do Salvá, em Salvaterra, no Arquipélago do Marajó, Mestre Damasceno construiu uma carreira marcada pela força da tradição oral, pela música e pela resistência cultural. Aos 19 anos, perdeu a visão em um acidente de trabalho, mas seguiu firme no compromisso de difundir o carimbó e o boi-bumbá. Criador do espetáculo Búfalo-Bumbá e líder do grupo Nativos Marajoara, segue ativo aos 70 anos, encantando gerações com sua arte.

No bate-papo, Guto Nunes destacou a sensibilidade do Governo do Pará, por meio da Secretaria de Estado de Cultura (Secult), em incluir Mestre Damasceno entre os homenageados da Feira. “Ele ficou muito feliz, muito honrado. É um mestre da tradição oral e o convite simboliza uma reparação. Por mais que fosse excluído de espaços literários convencionais, por sua obra não estar ‘deitada no papel’, ele hoje é coroado por sua trajetória. É um homem preto, cego, amazônida, que alcançou territórios inimagináveis, até a academia, com dissertações de mestrados, e abre caminhos para outros mestres da oralidade”, afirmou.

Saberes – O professor Agenor Sarraf, da Universidade Federal do Pará (UFPA), ressaltou a importância de valorizar os saberes ancestrais representados pelo mestre. “Damasceno construiu um grande espetáculo de arte, cultura e sabedoria. Seu Búfalo-Bumbá traz a herança indígena e africana, e reconhecer sua história é também incentivar que outros mestres das diversas regiões do Pará sejam valorizados. Ele nos ensina a explicar o mundo a partir da cantoria, e isso é essencial num momento de crise climática, quando precisamos olhar para os saberes que mantiveram a floresta de pé”, pontuou.

A jornalista e militante cultural Priscila Cobra, presente no encontro, reforçou o impacto do legado do homenageado. “O Mestre Damasceno é razão de orgulho para todos nós do carimbó. Enquanto mulher negra da periferia de Belém, vejo nele uma inspiração ainda maior, porque ele traduz nas suas composições a relação íntima com o território, com o quilombo, com a ancestralidade e com a natureza amazônica. Ele é poesia, resistência e força, e encoraja as novas gerações a seguirem na luta pela cultura popular”, declarou.

O reconhecimento a Damasceno vem de longa data e inclui importantes honrarias, como a Comenda Eneida de Moraes (2023), a Medalha Mestre Verequete (2023) e o título de Cidadão de Belém. No mesmo ano, sua obra foi declarada patrimônio cultural imaterial do Pará e, em 2024, tornou-se imortal da Academia Marajoara de Letras. Sua discografia soma mais de sete álbuns e participações em coletâneas, além de prêmios nacionais, como a indicação ao Prêmio da Música Brasileira de 2024.

Tradição – A programação cultural da noite contou ainda com shows de três referências do carimbó paraense: Mestre Robledo, Mestre Eliezer e o grupo Nativos Marajoara. Amigo de longa data de Damasceno, Robledo trouxe ao palco a tradição herdada de seu pai, o Mestre Pau Que Ronca, e ressaltou a emoção de dividir a homenagem. “É uma alegria estar aqui celebrando a vida desse irmão de caminhada. O carimbó e o boi são mais fortes porque caminhamos juntos”, disse.

Mestre Eliezer, de Soure, também subiu ao palco com seu grupo Cruzeirinho. Tocador de curimbó e defensor da cultura marajoara, ele lembrou que a valorização dos mestres populares é essencial para a permanência da tradição. “Esses momentos de encontro são sementes que a gente planta nas novas gerações, para que o carimbó siga vivo, pulsando no Marajó e em todo o Pará”, afirmou.

O encerramento ficou por conta dos Nativos Marajoara, grupo liderado pelo próprio Mestre Damasceno. Em um show emocionante, os músicos apresentaram canções de álbuns recentes, como Chegou Meu Boi e Encontro D’Água, mesclando carimbó, banguê e toadas de búfalo-bumbá. O público presente no Hangar acompanhou de perto e celebrou com palmas e danças o legado de Damasceno, que vibrou ao lado dos parceiros de palco.

Guto Nunes disse, ainda, que a sensação era de celebração e continuidade. “Entre aplausos e depoimentos emocionados, ficou claro que a homenagem não era apenas a um artista, mas a uma história de resistência, ancestralidade e amor pela Amazônia. O Bate-papo e os shows na Feira Pan-Amazônica do Livro reafirmaram que a voz de Mestre Damasceno é, de fato, uma das multivozes que ecoam pela floresta, pelos rios e pelos territórios do Pará”, concluiu.

Foto: Pedro Guerreiro / Ag. Pará

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