O Ministério Público Federal (MPF) entrou com ação na Justiça Federal, com pedidos urgentes para que, por uma série de ilegalidades, seja anulada a licença para obras de explosão de rochas e de retirada de bancos de areia do leito do Rio Tocantins, no Pará. O projeto tem o objetivo de permitir o tráfego de grandes embarcações e de comboios de barcaças durante os períodos de seca na hidrovia Araguaia-Tocantins e pretende incluir a remoção de parte da formação rochosa – técnica chamada de derrocagem ou derrocamento – da área conhecida como Pedral do Lourenço.
Segundo o MPF, não houve a obrigatória consulta prévia, livre e informada às populações indígenas, quilombolas e comunidades ribeirinhas potencialmente afetadas pelo empreendimento, conforme prevê a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Além disso, a licença atestou a viabilidade socioambiental do empreendimento sem que essa viabilidade tenha sido demonstrada em relação ao meio socioeconômico e ao conjunto dos organismos vivos do ecossistema, conforme registrado em pareceres técnicos do próprio Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), sendo que a precariedade do diagnóstico da atividade pesqueira foi um dos aspectos mais negativos nesse contexto, alertam procuradoras e procuradores da República.
A Diretoria de Licenciamento Ambiental do Ibama, chegou a recomendar que a autarquia concluísse pela inviabilidade do empreendimento. Em seguida, sem que novos estudos tivessem sido apresentados, o próprio diretor emitiu parecer totalmente contrário ao que ele mesmo tinha dito, desta vez com o entendimento de que a viabilidade ambiental teria sido demonstrada, destaca o MPF na ação.
Nesse sentido, a ação também pretende reverter decisões de agentes políticos que, contrariando todos os pareceres técnicos existentes no licenciamento e sem fundamentação técnica e jurídica, resultaram em graves falhas no diagnóstico da atividade pesqueira, tanto em termos metodológicos, quanto em termos de abrangência. Por fim, o MPF pediu que a Justiça impeça o Ibama de emitir novas licenças até que as ilegalidades sejam corrigidas.
ENTENDA O CASO
Desde 1995, o poder público tenta aumentar a capacidade de navegação no Rio Tocantins. O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) chegou a desencadear a tramitação simultânea de dois processos diferentes de licenciamento, sendo um no Ibama e outro na Secretaria de Meio Ambiente e Sustentabilidade do Estado do Pará (Semas).
Em 2009, apesar de a Justiça Federal ter acolhido pedido do MPF e ter impedido o fracionamento ilegal do licenciamento, a Semas emitiu licença prévia para o empreendimento. Em seguida, a licença foi anulada e o processo de licenciamento foi arquivado.
Em 2013, o Dnit voltou a pedir ao Ibama a autorização para as obras. A nova licença foi concedida em outubro de 2022. Por meio da dragagem e do derrocamento, o Dnit pretende criar um canal de navegação com capacidade para tráfego permanente de grandes embarcações e comboios de barcaças ao longo de aproximadamente 560 quilômetros, desde Marabá (PA) até o porto de Vila do Conde, em Barcarena (PA).
De acordo com as investigações do MPF, no processo de licenciamento o Dnit adotou uma série de artifícios ilegais e sem embasamento técnico para reduzir artificialmente as áreas de influência do empreendimento, o que resultou na exclusão de diversos povos e comunidades impactados tanto do direito à consulta prévia, quanto da abrangência das avaliações de impactos sobre a atividade pesqueira.
Imagem: Antônio Cavalcante/Setran/Reprodução