O acidente vascular cerebral (AVC) é uma das principais causas de morte e incapacidade no mundo. Apenas no Brasil o derrame está associado a cerca de 100 mil óbitos por ano, de acordo com o Ministério da Saúde.
Diante de um episódio, a agilidade no atendimento médico amplia as chances de sobrevivência e recuperação do paciente. Um novo estudo indica que um teste ocular pode ajudar a prever o risco do problema.
Publicada no periódico Heart, a pesquisa sugere que uma espécie de “impressão digital” vascular na retina pode estimar a probabilidade de derrame com a mesma precisão que os fatores de risco tradicionais, mas sem a necessidade de testes laboratoriais invasivos.
O médico cardiologista Eduardo Lima, do Hospital Nove de Julho, explica que predizer as chances de um AVC nem sempre é algo simples. Atualmente, são utilizadas diferentes ferramentas preconizadas por sociedades médicas, que auxiliam os profissionais na estratificação do risco.
Contudo, a realização dessa estimativa pode variar de acordo com características populacionais e o tipo de derrame associado. A maioria dos casos é causada por fatores de risco modificáveis, como pressão alta, colesterol alto, dieta inadequada e tabagismo.
“Esse estudo apresenta uma ferramenta personalizada. Nos resultados, eles comparam o poder de predição dessa tecnologia, usando inteligência artificial, versus os scores tradicionais. O trabalho mostra que, usando essa metodologia de mapeamento da retina, é possível melhorar a capacidade de previsão”, resume Lima.
Segundo os autores, essa “impressão”, que compreende 29 indicadores de saúde vascular, é uma abordagem prática, ideal para implementação em unidades com poucos recursos.
A intrincada rede vascular da retina é conhecida por compartilhar características anatômicas e fisiológicas comuns com a vasculatura do cérebro. Essa semelhança a torna uma via possível para avaliação danos causados por problemas de saúde sistêmicos, como diabetes, segundo os cientistas.
No entanto, o seu potencial para previsão de risco de AVC não foi totalmente explorado, devido a descobertas variáveis de estudos e uso inconsistente da técnica de imagem especializada para o fundo do olho.
Para aprofundar a análise, os especialistas mediram 30 indicadores em cinco categorias de arquitetura vascular da retina, a partir de imagens oculares de mais de 68 mil participantes da base de uma ampla base dados biológicos britânica.
Foram avaliados calibre (comprimento, diâmetro, proporção), densidade, torção, ângulo de ramificação e complexidade das veias e artérias. P estudo levou em conta fatores de risco potencialmente importantes, como fatores demográficos e socioeconômicos, estilo de vida, além de parâmetros de saúde, como pressão arterial, colesterol, indicador de glicemia e índice de massa corporal (IMC).
A análise final incluiu mais de 45 mil indivíduos, com idade média de 55 anos. Durante um período médio de monitoramento de 12,5 anos, 749 participantes tiveram um AVC.
De acordo com a pesquisa, em geral foram afetadas pessoas significativamente mais velhas, do sexo masculino, fumantes e diabéticas. Elas também apresentavam peso superior, tinham pressão arterial mais alta e níveis mais baixos de colesterol “bom”, todos fatores de risco conhecidos para derrame.
No que diz respeito aos indicadores vasculares da retina, cada mudança no quesito densidade se mostrou associada a um risco aumentado de derrame de 10 a 19%. Enquanto alterações semelhantes no contexto de calibre revelaram um crescimento na probabilidade de 10 a 14%.
Vale destacar que trata-se de um estudo observacional e, portanto, nenhuma conclusão pode ser tirada sobre causa e efeito.
“Claro, nos entusiasmamos com esse tipo de metodologia, mas para ela ser aplicada na prática clínica é interessante que sejam realizados novos estudos. Como, por exemplo, uma pesquisa de aplicação da ferramenta com a avaliação de possíveis mudanças de conduta ou, eventualmente, uma redução de eventos, no caso, o AVC”, conclui Lima.
Fonte: Saúde.Abril/Imagem: Brands&People/Unsplash/Divulgação