segunda-feira, abril 7, 2025
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Estudo avalia a saúde cardiovascular dos tamanduás-bandeiras no país

Conclusões podem ajudar sobrevivência dos animais resgatados

Antes presente em quase todo o território brasileiro e em grande parte da América do Sul, o tamanduá-bandeiras é uma das espécies ameaçadas de extinção no país e requer cuidados que vão além da preservação do seu habitat. Um estudo realizado por universidade federais indica que essa espécie, quando resgatada e em cativeiro, precisa de atenção especial por seu risco aumentado de problemas cardíacos.

O trabalho, publicado no periódico acadêmico Journal of Zoo and Wildlife Medicine, identificou que os animais nessa condição acabam desenvolvendo quadros de insuficiência cardíaca em razão da alimentação inadequada. 

A pesquisa foi realizada pela Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), com participação da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Para o professor do Departamento de Ciências Fisiológicas do Instituto de Ciências Biológicas e da Saúde da UFRRJ, Sávio Amado da Silva, as conclusões são um passo importante para a preservação da espécie, por reconhecer a predisposição dos tamanduás-bandeiras a doenças cardíacas, especialmente entre os animais resgatados, que foram obrigados a viver em criadouros artificiais ou que se tornaram cativos em zoológicos.

“Considerando que a cardiomegalia e outras doenças cardíacas são frequentes nessa espécie e podem levar à morte desses animais, o estabelecimento dos parâmetros próprios e confiáveis na ecocardiografia é o primeiro grande passo para termos segurança no diagnóstico de doenças cardíacas. Logo, a partir desse padrão, haverá maior eficiência no tratamento de animais doentes, que poderão ser recuperados em menor tempo, viabilizando a reprodução e manutenção de suas populações, seja em cativeiro ou na vida-livre”, afirma.

Dieta de insetos

Principal responsável pelo estudo, o professor do Hospital Veterinário da UFMT Pedro Eduardo Brandini Néspoli explica que a predisposição a doenças cardíacas da espécie ganha um risco aumentado devido à dificuldade de replicar a dieta desses animais em cativeiro. 

“É uma alimentação difícil de ser feita nessas condições. Você não tem como capturar formigas e outros insetos para dar para esses animais, então, você tem que fazer uma ração balanceada”.

Segundo o pesquisador, na ausência de um Centro de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) bem estruturado na região, o Hospital Universitário da UFMT atende muitos animais encaminhados pela Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura (Sema) do estado. “Tínhamos um acervo de um zoológico, que agora virou um Cetas, mas esses animais que estavam no zoológico começaram a adoecer. A dieta desses animais era muito complicada, porque comem formigas, cupins, insetos”. 

Com o tempo, alguns animais começaram a apresentar quadros de insuficiência cardíaca. A partir de exames ecocardiográficos, — que utilizam ondas de ultrassom para produzir imagens do coração — a equipe de pesquisadores envolvidos no estudo constatou um aumento das cavidades cardíacas dos tamanduás-bandeiras avaliados, que poderia estar relacionado à redução da função de contração do coração dos animais. 

“Como não tinha nada a respeito dos parâmetros desses animais na literatura, ficávamos na dúvida sobre até que ponto a contratilidade estava reduzida ou se isso era apenas uma questão da espécie”, conta Néspoli à Agência Brasil.

Para estabelecer uma comparação, surgiu a necessidade de fazer os exames em animais de vida livre: “Todos os indivíduos de vida livre que chegavam ao hospital e que não tinham alterações cardíacas, que as partes de pressão e tudo mais estavam normais, incluímos na pesquisa”. 

Ao todo, os dados utilizados no estudo resultaram de seis anos de pesquisa, com início em 2017 e conclusão em 2022. As informações coletadas e exames realizados levaram à descoberta de que, além do aumento das cavidades do coração, os índices de contratilidade usados para definir se há ou não uma alteração são muito próximos aos observados em animais de pequeno porte, como cães.

Néspoli também traz que com o estudo foi possível estabelecer um padrão para os índices de contratilidade da espécie e uma relação entre o peso do animal e o tamanho esperado para as cavidades do coração. “Os parâmetros que precisamos para avaliar se tem aumento de volume do órgão, se está com o aparelho mais delgado ou mais hipertrofiado, agora conseguimos ter uma com base nesse estudo. Então, foi uma pesquisa de base para termos referências para poder fazer exames em outros animais”, complementa.

Mato Grosso- 04/04/2025 Pesquisadores estudam cardiopatias em tamanduás-bandeiras. crédito: Divulgação/UFMT
Pesquisadores estudam cardiopatias em tamanduás-bandeiras. Divulgação/UFMT

Espécie vulnerável

Em 2022, o tamanduá-bandeira foi categorizado como “vulnerável” de acordo com a plataforma Salve, do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio). Com distribuição na América do Sul, incluindo o Brasil, onde está presente na Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica e Pantanal, a preservação da espécie enfrenta principalmente a diminuição de áreas conservadas, o atropelamento em estradas, as queimadas em florestas e a caça, conforme o pesquisador da UFRRJ. 

Além da ação antrópica, Silva também destaca as mudanças climáticas, em especial o aquecimento nos biomas brasileiros, como fator que favorece a diminuição da população desses animais, já que os tamanduás-bandeiras são muito sensíveis ao calor extremo, mais do que outras espécies de mamíferos no Brasil, conforme o professor. 

“Se houvesse o cumprimento das leis de conservação vigentes no país, apenas isso já seria um grande avanço para a manutenção numérica da espécie. Ou seja, o controle do desmatamento, a coibição, a prevenção e a punição de queimadas, a punição da caça e da comercialização de animais selvagens, entre outras ações, representariam um avanço enorme e benéfico para a preservação dos tamanduás-bandeiras”, pontua.

Como medidas complementares para a estabilização populacional da espécie, o professor ainda cita a reordenação de corredores florestais, propiciando uma maior área para obtenção de alimentos, e a “preocupação governamental em construir pontos de passagem em rodovias federais, estaduais e municipais”.

*Estagiária sob supervisão de Gilberto Costa

Francielly Barbosa* – repórter da Agência Brasil

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