Em um sábado frio de maio de 2008, durante o feriado de Corpus Christi, o então cardeal Jorge Mario Bergoglio discursava para milhares de jovens na Praça Once, em Buenos Aires. Ao fim do evento religioso, uma cena comum para quem conhecia sua rotina simples: o arcebispo da capital argentina desceu as escadas do metrô e embarcou, sozinho, rumo à Catedral Metropolitana.
Foi ali, entre bancos de plástico e passageiros anônimos, que o fotógrafo Pablo Leguizamon registrou a imagem que, anos depois, se tornaria icônica. Sem saber que aquele homem de preto, discreto e sereno, se tornaria o Papa Francisco, o jovem estudante de fotojornalismo de 29 anos seguiu seu instinto.
“Não era habitual ver um arcebispo no metrô. Mas Bergoglio não era como os outros”, relembra Pablo, hoje com 46 anos. “Ele parecia mais um monge, ou o padre de uma paróquia qualquer.” Sem trocar uma palavra com o cardeal, nem pedir que olhasse para a câmera, o fotógrafo capturou o momento em silêncio e desceu do vagão, deixando Bergoglio seguir seu caminho.
A imagem ganhou valor simbólico com o tempo, principalmente após a eleição de Bergoglio ao papado em 2013. E agora, com sua morte na última segunda-feira (21), ressurge como uma síntese da vida e do legado do Papa Francisco: humildade, proximidade com o povo e desapego ao luxo. Mesmo como papa, Francisco rejeitou os suntuosos Apartamentos Papais, preferindo viver na Casa Santa Marta, uma hospedaria modesta no Vaticano.
Seus gestos de simplicidade começaram bem antes do conclave que o elegeu estavam enraizados em sua rotina em Buenos Aires, onde era visto em bairros populares, tomando mate e conversando com moradores nas ruas. A fotografia de Leguizamon é, hoje, mais que um retrato casual: é um documento histórico, um espelho da essência de Francisco. “Ele levantou o olhar por alguns segundos. Algo havia lá. Tive uma intuição, um palpite”, recorda o fotógrafo. E acertou.
imagem: Pablo Leguizamon