Com obras que exaltam a beleza e a força da região amazônica, fotógrafo paraense participa de mostra internacional que une arte, cultura e sustentabilidade em Nova York
A Amazônia pulsa em cada clique de Maycon Nunes. Mais que fotógrafo, ele é um contador de histórias visuais que transforma o cotidiano do Norte em poesia. Ao ter sua obra selecionada para a exposição “TERRA The Essence of Survival”, em Nova York, Maycon reafirma que sua arte ultrapassa fronteiras, mas mantém raízes profundas no coração amazônico.
Natural de Florianópolis (SC), mas radicado há 20 anos no Pará, Maycon conta que sua relação com a Amazônia começou antes mesmo de pisar nela. “Desde pequeno, ouvia histórias do meu tio, que já tinha morado na região. Quando cheguei aqui em 2005, tudo que era imaginação virou realidade. E hoje, não só leio histórias da Amazônia, como escrevo junto com os personagens que encontro pelo caminho.”
Com mais de 20 anos de carreira, ele já fotografou em muitos lugares do Brasil, mas foi no Pará que encontrou não apenas cenário, mas sentido. “O Pará me formou como ser humano. Me mostrou que a fotografia pode ser oração. Pode ser afeto, denúncia, respiro. Aqui, aprendi que a imagem precisa ter alma”, diz, com a voz embargada pela emoção.
A infância que voa, a fé que resiste. Com afeto e lente, Maycon Nunes transforma o cotidiano amazônico em arte
Um de seus projetos mais afetivos é a série Meninos Voadores, que mostra crianças pulando de barcos nos portos amazônicos, em cenas espontâneas de brincadeira e liberdade. “Essa série tem muito de mim. Já me vi ali, na infância, na alegria desses meninos. Muitas vezes eu dou minha câmera para eles fotografarem também. É uma sementinha que pode germinar.”
“Aqueles meninos são poesia pura. Eles não sabem que estão fazendo arte, e talvez por isso façam. É uma infância viva, que me emociona cada vez que revejo essas imagens.”
Para Maycon, sua fotografia tem três pilares: os grandes cenários, os flagrantes do cotidiano e os retratos que sempre vêm carregados de histórias e vínculos afetivos. “Eu conheço as pessoas que fotografo, sei os nomes, as histórias. Troco ideia, mando as fotos para elas. É uma troca. A fotografia só faz sentido para mim se for humanizada.”
Maycon não se limita ao olhar técnico. Seu processo é de escuta e convivência. Ele passa dias com as comunidades que fotografa, compartilha silêncios, aceita café, aprende nomes. “Só levanto a câmera quando sinto que pertenço de algum modo àquele espaço”, conta.
Em uma de suas fotografias mais fortes, um homem rema em silêncio por um igarapé coberto de névoa. Não há rosto visível, mas há uma história inteira ali. “É sobre resistência. Sobre quantos remos precisamos dar todos os dias pra sobreviver na Amazônia.”
Um olhar que abraça e denuncia

Ao caminhar pelos mercados de Belém ou pelas palafitas de Abaetetuba, Maycon encontra beleza onde o mundo costuma desviar o olhar. Ele fotografa sem pressa: espera o gesto, o olhar, a luz certa que revela o invisível. “Eu quero que as pessoas sintam as minhas fotos. Que vejam nelas uma possibilidade de se conectar com o outro. O fotógrafo que não sente, não revela nada.”
Sua arte, no entanto, não é apenas estética. É também política. Denuncia silenciosa de um Brasil que abandona sua floresta e seu povo. “A Amazônia está viva. Mas ela sangra. E se a gente não olhar pra isso com respeito, com urgência, com amor… ela vai se calar.”
Reconhecimento que ecoa longe
Selecionado para a mostra “TERRA”, na galeria Saphira & Ventura, Maycon divide espaço com outros artistas que dialogam com a sustentabilidade e a preservação. Mas seu diferencial está na intimidade com a Amazônia não como conceito, mas como vivência. É o menino que pula no rio, a mulher que prepara peixe, o ribeirinho que rema com o mundo nas costas.
“Essa exposição é importante porque fala de essência. E a essência da Amazônia não está só na árvore, mas no olhar de quem vive lá. É isso que eu tento mostrar”, afirma.
Esta é a terceira vez que o fotógrafo expõe em Nova York, consolidando sua presença no cenário artístico internacional. Seu trabalho vai além da técnica. Ele enxerga a fotografia como algo espiritual: “Para mim, fotografar é uma forma de oração. É o instante único que nunca mais vai acontecer, e que eu sinto como um sinal divino. É quando meus olhos não só veem, mas sentem.”
A mostra tem apoio de instituições como FGV Europe, Câmara de Comércio Brasil-EUA, Instituto ODS Amazônia e Bienal Amazônia, e inclui debates sobre arte, meio ambiente e um show da cantora Ana Fernandez.
Entre o rio e a lente, Maycon Nunes segue revelando o invisível. Com ternura, com verdade, com o coração cheio do Norte, ele declara que o Pará lhe deu tudo: “Me deu norte. Me deu casa. Me deu profissão, filha, esposa, amigos. Me deu propósito.” E sua retribuição vem em forma de imagem, afeto e pertencimento.
Na visão dele, a arte é também uma forma de resistência e convite. “Não quero que olhem a Amazônia com uma lente distante, como quem vê de longe. Quero que usem uma lente grande angular aquela que aproxima e inclui mais gente na foto. Que cheguem perto. Que escutem, sintam e compartilhem.”
Por: Thays Garcia/ A Província do Pará
Imagem: Divulgação Maycon Nunes