Em Cametá e Mocajuba, nas margens largas do Tocantins, o tempo guarda segredos entre pedras, nomes, túmulos e silêncios.
Mas na última quinta-feira, 1º de maio de 2025, a história voltou a respirar: a Sinagoga dos Hebraicos de Cametá/Mocajuba, antiga Beit HaShalom, foi reinaugurada, exatamente dois séculos após a chegada de seus primeiros fundadores vindo do norte da África e mediterrâneo.
Foi mais do que um evento: foi um reencontro de famílias e descendentes de judeus marroquinos e portugueses vindos de longe – de Belém, de Portugal, de vilarejos amazônicos e grandes centros urbanos – voltaram ao berço de seus ancestrais para celebrar 200 anos da presença judaica na Amazônia. Entre preces, cânticos e lágrimas, o Rabino Elmescany, líder espiritual da Amazônia Judaica, declarou: “Onde há memória, há eternidade.”
Essa memória começa em 1824, quando, sob a nova Constituição do Império do Brasil, a liberdade de culto permitiu que os primeiros judeus erigissem seu santuário nas terras de Cametá.
Cametá floresceu como um dos primeiros centros judaicos do país, com uma comunidade vibrante que chegou a somar mais de 7.000 pessoas. Entre Shabat, estudos de Torá e ensinamentos em hebraico e francês, judeus como os Cohen, Sabbá, Bensiman, Bemuyal e alguns filhos dos cristãos- novos escreveram um capítulo único da história brasileira — não nas capitais, mas no coração verde da floresta.

A sinagoga, tragada em parte pelo tempo e pelas águas do rio, nunca foi esquecida. Seus objetos sagrados sobreviveram, seu cemitério permanece, suas histórias foram transmitidas em voz baixa, nos sobrenomes e nos olhos de quem ficou. A partir de 2010, os Bnei HaKehilah — Filhos da Comunidade — decidiram que era hora de ouvir essas vozes de novo. E reconstruíram, pedra por pedra, gesto por gesto, a casa onde a paz voltou a morar.
Hoje, duzentos anos depois, a Amazônia canta uma bênção antiga em uma língua eterna. E declara: o judaísmo nunca se perdeu — ele apenas esperava a hora certa de voltar.